Os bombeiros tiveram uma importante ajuda durante as buscas por pessoas desaparecidas em decorrência da catástrofe natural que atingiu o estado e, principalmente, o Vale do Taquari no início de maio. Também chamados de “bombeiros de quatro patas”, os cães farejadores foram cruciais na localização de corpos, inclusive da mulher que estava desaparecida em Teutônia.
Diversas corporações do Brasil vieram ao RS acompanhados de “binômios”, isto é, duplas compostas por bombeiro militar e cão de busca. O Corpo de Bombeiros da Polícia Militar do Estado de São Paulo, por meio do Grupamento de Ações em Emergências e Desastres (Gaed), foi uma das corporações presentes na região com os cães farejadores. Com bases operacionais estabelecidas em Lajeado e, posteriormente, na Associação Beneficente Pella Bethânia, em Taquari, o efetivo, incluindo os binômios, se revezava a cada 10 dias. No total, foram oito forças-tarefas enviadas para o RS.
A Força-Tarefa 08, que esteve no estado entre os dias 9 e 19 de julho, atuou com 25 bombeiros e duas cadelas farejadoras: a “Mari”, de 4 anos, e a aprendiz Luna, de apenas 6 meses. Elas são da raça pastoras belgas de Mallinois e estavam acompanhadas de seus respectivos tutores, o sargento Gabriel Seuma Soares e soldado Gustavo Santana. Juntos, integram o “efetivo” de nove cadelas farejadoras do canil do Gaed de São Paulo.
Enquanto para a cadela Luna a missão no RS foi uma das primeiras experiências a campo, Mari já acumula um vasto currículo. Entre as operações que ela atuou estão o terremoto da Turquia, em 2023; rompimento da barragem de Brumadinho (MG), em 2019; deslizamento de terra em Petrópolis (RJ), em 2022; enchente em São Sebastião (SP), em 2023; e soterramento de Franco da Rocha (SP), em 2022.

Umas das cadelas farejadoras do GAED-SP em operação em Taquari (Foto: Divulgação)
Peculiaridades
A capacidade olfativa dos cães é o principal diferencial para o uso desses animais nas ações de buscas e resgates. Estudos científicos apontam que os caninos têm 220 milhões de células olfativas, enquanto os seres humanos contam com cerca de 5 milhões.
O sargento Seuma explica que é seguida uma série de critérios para a escolha dos cães que vão integrar a corporação paulista. O primeiro critério é o fato de somente serem escolhidas fêmeas, devido a questões hormonais e comportamentais. Ainda filhotes em sua matilha, as cadelas passam por vários testes, onde aquela que se destaca é levada para treinamento. “A genética também é levada em conta, pois 70% do comportamento de um cão vêm dos pais”, observa.
Outro aspecto importante é a raça. O Gaed paulista utiliza preferencialmente cadelas da raça pastor belga de Mallinois, em razão da sua versatilidade, energia e facilidade de assimilar comandos. “Atuamos em muitas ocorrências de deslizamentos de terra e escombros. Então o Mallinois caminha melhor nestes ambientes. O labrador, embora comum no Sul, não é a nossa preferência, apesar de também estar no efetivo”, esclarece o sargento. Segundo ele, a raça costuma apresentar displasia coxofemoral, doença de origem genética que causa alteração nas articulações. Com o piso acidentado, esse problema tende a agravar, obrigando o labrador a se afastar do trabalho.
Cada cadela que atuar em salvamentos recebe um tipo de treinamento. As “cadelas de odor específico” são aquelas que vão procurar somente uma vítima a partir do cheiro de uma peça de roupa. Já as “cadelas de odor generalizado”, que atuaram no RS, são treinadas por meio da técnica Kasar, sendo capazes de localizar qualquer tipo de vítima humana, seja em enchentes, deslizamento de terras ou estruturas colapsadas.
Todas as cadelas são treinadas para localizar humanos. “Como as células humanas em decomposição têm odor específico, as cadelas ignoram qualquer outro tipo de odor, como a de um animal em decomposição. Devido à sua capacidade olfativa, um pedaço pequeno de pele será o suficiente para a cadela farejadora mudar o seu comportamento e apontar a localização”, frisa Seuma.

Soldado Gustavo Santana com a aprendiz Nina (Foto: Édson Luis Schaeffer)
Aposentadoria
Os binômios ficam juntos a vida toda, desde a sua seleção na matilha até a sua aposentadoria. “A Mari, por exemplo, só interage comigo, só trabalha comigo. Ninguém mais consegue trabalhar com ela e fazer atividades do dia a dia. A brincadeira até é com todos, mas o trabalho e manejo são somente com o condutor”, explica o sargento.
Após oito anos de trabalho, sempre à disposição dos bombeiros para salvar vidas ou localizar vítimas, chega aquele momento que é objetivo também de muitos humanos: a aposentadoria.
Mas isso não representa quebra de vínculo. Afinal, após este período juntos, é o condutor que ficará com ela. Não sendo possível, o condutor pode selecionar outra pessoa de confiança que adotará a bombeira de quatro patas.