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Ilustre Cidadão

“Durante muitos anos, eu fui o único anestesista no hospital”

O quadro Ilustre Cidadão entrevista Décio Driemeier

Por: Marco Mallmann

28/11/2024 | 09:24 Atualização: 05/03/2025 | 14:22

Décio Driemeier tem 75 anos. Iniciou os estudos de medicina na Faculdade Federal de Medicina de Rio Grande, em 1971. Se formou em 1976 e fez residência no Hospital de Clínicas, em Porto Alegre, para anestesia. Em 1978, decidiu retornar para Teutônia. Como anestesista, atuou no Hospital Ouro Branco (HOB) por 37 anos e é lembrado por gerações de famílias. Hoje, atende em seu consultório de clínica geral no Centro Clínico Ouro Branco, também como médico do trabalho. 

Quando iniciou o trabalho no HOB?

Décio Driemeier – Em 1976, o Milton Schneider (em memória), diretor do Hospital Ouro Branco, me disse que estavam precisando muito de anestesista, porque os que trabalhavam aqui vinham de Estrela e, muitas vezes, no hospital passavam dificuldades quando necessitavam de um profissional com urgência. No dia seguinte do convite, fui ao Hospital de Clínicas e pedi para fazer o restante do estágio na área de anestesia.

Como era o trabalho naquela época?

Driemeier – Só havia três médicos aqui no hospital e o número de anestesias era de, mais ou menos, 30 a 40 por mês. Isso fez com que eu não pudesse ficar fazendo só anestesia, aí fazia clínica junto. Trabalhei até 2015 como anestesista. Durante muitos anos eu fui o único anestesista no HOB. Como na época não existia celular, para sair da minha casa eu tinha que registrar no hospital para onde eu ia e qual era o telefone de contato comigo, porque a gente nunca sabia quando iria ser chamado. Outra coisa que também era importante: eu nunca podia tomar um copo de vinho, uma espumante ou uma cerveja, porque eu nunca sabia quando ia ser chamado. Nós fazíamos plantão em casa e éramos chamados para o hospital quando surgia uma consulta. Não tinha hora e a gente trabalhava muito. Tinha noites que eu era chamado dez vezes para ir ao hospital, não dormia, e no outro dia, de manhã cedo, tinha que estar lá para fazer anestesia. De manhã, levantava cedo e ia para o bloco cirúrgico; depois, visitava os doentes hospitalizados, ia para o consultório, chegava em casa e almoçava voando e já ia para a Paquetá. Voltava para o consultório, isso quando não tinha cirurgia já. Chegava de noite cansado em casa, mas aí tocava o telefone, porque tinha consulta de plantão no hospital.

E por que deixaste de ser anestesista?

Driemeier – Eu sou muito rigoroso em termos de horário e isso, lá no bloco cirúrgico, eu não conseguia manter, porque a minha atividade dependia dos horários que os outros chegavam. Isso, muitas vezes, me angustiava e acabou fazendo com que eu desistisse da anestesia, em 2015. Passei a fazer só clínica geral e medicina do trabalho, que foi uma especialização que eu fiz na Faculdade Católica de Ciências Médicas de Porto Alegre, durante um ano. Eu trabalhava na Paquetá também, fui o médico lá por 18 anos.

Como surgiu a vontade de ser médico e qual a sensação hoje?

Driemeier – Desde criança eu sonhava com isso. Depois, eu trabalhei na farmácia e no setor de escritório do hospital. Lá eu via as coisas acontecendo, até que um dia eu decidi que faria medicina. Meus pais não tinham condições financeiras para pagar a faculdade, mas eu decidi que cursaria, nem que eu precisasse ser porteiro de boate. Foi quando eu passei no vestibular e meus tios pagaram meus estudos. Hoje, me sinto feliz, realizado. Mesmo com minha idade e com tantos médicos aqui, sempre tenho serviço suficiente no consultório. Eu sinto a gratidão de muita gente que ajudei. Filhos e netos de pessoas que atendi hoje são meus pacientes. Agora a minha vida é mais tranquila, não tenho mais plantões no hospital.

Lembras de curiosidades da profissão?

Driemeier – Uma coisa interessante na minha formação médica foi que, em 1974, terminado o quarto ano de medicina, eu fui pelo Projeto Rondon para o Amazonas, em Atalaia do Norte, na divisa do Brasil com o Peru e a Colômbia. Era uma cidade que não tinha médico. Existia um hospital de campanha que os ingleses tinham usado na guerra e doado e tinha só uma enfermeira que trabalhava lá. Fui também para o Mato Grosso, em Cáceres, já no quinto ano de medicina, trabalhar. Outra coisa importante é que eu nunca perdi um único doente em anestesia. Teve uma morte na recuperação, mas na mesa de cirurgia nunca faleceu nenhum paciente meu.

O que representará a UTI no HOB?

Driemeier – Vai nos colocar em outro patamar em termos médicos, isso também vai trazer mais profissionais especializados em muitas áreas que hoje não temos. É um desafio que nós temos pela frente, mas os benefícios também estão por vir.

Na área social, fostes o primeiro presidente do Rotary de Teutônia?

Driemeier – Sim, de maio de 1999 até julho de 2000. Um dia, pessoas do Rotary Engenho, de Lajeado, que me conheciam me pediram se havia interesse em fundar um Rotary em Teutônia. É uma entidade que muito me orgulha, faz um trabalho maravilhoso, muito importante. Também fui, durante um tempo, o presidente da Sociedade de Medicina do Alto Taquari (Smat). Em 1997, ano em que a entidade completou seu Jubileu de Ouro, estimulei o escritor, professor, pesquisar e jornalista José Alfredo Schierholt a escrever o livro “À sombra de plátanos – história da saúdeno Vale do Taquari”, trazendo um resgate de todos os hospitais do Vale e seus médicos. É uma parte importante da nossa história que está ali registrada.

Entrevista publicada na edição impressa do Informativo Regional de 28 de novembro de 2024

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