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DIA DA REFORMA

Entre sinos, torres e vitrais, templos sustentam o legado luterano

Erguidos por imigrantes alemães a partir de meados do século XIX, espaços se tornaram marcos da colonização e refletem a identidade e a trajetória das comunidades em Teutônia e região

Por: Marcel Lovato

30/10/2025 | 16:00 Atualização: 30/10/2025 | 16:05
Inauguração da Paróquia da Comunidade Redentor do Bairro Canabarro em meados de 1909 | Foto:  Arquivo Selby Wallauer/divulgação
Inauguração da Paróquia da Comunidade Redentor do Bairro Canabarro em meados de 1909 | Foto: Arquivo Selby Wallauer/divulgação

Iniciada em 1517, a Reforma Protestante, celebrada em 31 de outubro, consolidou-se ao longo dos séculos, ultrapassou fronteiras e ecoou nas colônias formadas pelos imigrantes alemães que chegaram ao Rio Grande do Sul, a partir de 1824. A presença luterana influenciou diretamente na trajetória, estilo de vida e identidade cultural dessas comunidades, sobretudo em âmbito regional. Nesse conjunto, o alicerce da fé materializada em templos que dimensionam a representatividade religiosa, resistem ao tempo e são modelo de zelo ao patrimônio.

Conforme o historiador Guido Lang, Teutônia foi composta, primordialmente, por colonos ligados ao Sínodo Rio-Grandense e atual Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB). Hoje, também há uma minoria integrante da Igreja Evangélica Luterana do Brasil (IELB). Com as escolas e cemitérios, os templos formavam a trinca da organização social, uma vez que foram criados em diversas picadas. O abandono governamental e o sentimento coletivo de “lançados à própria sorte” contribuíram para esse movimento.

Com a aquisição ou doação de área de terras, os colonos construíram pequenas capelas, erguidas, geralmente, com madeira e pedras extraídas do próprio solo. Em paralelo, destinavam o local para os sepultamentos, vide o exemplo da Comunidade Redentor do Bairro Canabarro, na qual o acesso principal divide o cemitério.

Mais que a devoção, as construções simbolizavam a perseverança e reforçaram o espírito comunitário. Lang menciona, ainda, a contribuição dos pastores leigos – também conhecidos como “pseudo pastores” –, em um período carente de religiosos com formação teológica. Gustav Adolf von Grafen, que chegou em idos de 1874, foi uma destas figuras. Tratava-se de um trabalho itinerante, com a improvisação de pontos de pregação, realização de batizados, casamentos, consolos e enterros, geralmente em casas de família.

Ensinamentos

De acordo com o pastor e doutor em História da Igreja, Martin Norberto Dreher, um dos principais elementos estruturais das igrejas originais era a ausência de campanário (ou seja, torre com sinos). Afinal, os luteranos eram proibidos pelo parágrafo 5º da Constituição do Império. Por outro lado, não havia restrições quanto às nomenclaturas, tanto que o templo da Comunidade Melanchton, localizado em Linha Germano, interior teutoniense, faz referência a Felipe Melanchthon, o principal colaborador de Martinho Lutero, e sucessor do líder reformista.

Dreher sublinha a importância da escola, uma vez que Lutero exigiu, ainda no século XVI, a construção desses estabelecimentos nas cidades e demais locais ocupados por alemães. “Todos os homens e mulheres deveriam ser alfabetizados e capazes de ler a Bíblia para perpetuar o evangelho. Quando os luteranos chegaram, o Brasil praticamente não investia em educação. Por isso, eles foram pioneiros”, destaca.

Além das torres, com o tempo, os templos também receberam os sinos. Além do convite para os cultos, os instrumentos anunciam falecimentos, lembram o alvorecer, a pausa ao meio-dia e o descanso às 18h. Em determinadas épocas, avisavam a comunidade em caso de ocorrência de sinistros, como incêndios. Na paróquia da Comunidade Paz, do Bairro Teutônia, a situação é curiosa, uma vez que o badalar ecoa, diariamente, a cada meia hora. Uma tradição que resiste ao tempo e reforça a sua importância histórica. A igreja é uma das mais antigas da microrregião.

O valor arquitetônico

Outro aspecto que chama a atenção nas igrejas luteranas é a beleza e distinção arquitetônica. De acordo com o professor de Arquitetura e Urbanismo da Univates, Augusto Alves,

“as variações de estilos ocorrem em função do período de construção, contexto e quem as ergueu, uma vez que a IELB é ligada ao Sínodo do Missouri, nos Estados Unidos, e a IECLB, de influência alemã”.

Fatores econômicos igualmente influenciaram na decisão.

Alves destaca que os pequenos templos interioranos apresentam, via de regra, estilo eclético, uma vez que misturam elementos góticos, neogóticos e românicos, por exemplo. Entre eles, vitrais, arcos pontiagudos e semicirculares, paredes espessas, janelas pequenas e verticalidade. Além disso, há a presença do Historicismo, uma corrente da arquitetura que prevaleceu entre os séculos XIX e o início do século XX e consistia na adaptação de estilos do passado e aplicação nas construções contemporâneas.

Uma das mais diferentes é a igreja da Comunidade Sião, de Linha Frank, em Westfália, erguida em 1887, e famosa também por ter sediado o batismo do ex-presidente Ernesto Geisel. “É uma igreja muito bonita. Tem o campanário de pedra, a inspiração principal na arquitetura medieval, e a mistura de estilos, como a escadinha na lateral, o telhado mais inclinado e a cruz minimalista. A construção possui grandes influências no passado e, ao mesmo tempo, apresenta concessões modernas. Ou seja, é um exemplo do historicismo”, analisa Alves.

Já o prédio da Comunidade Martin Luther, no Bairro Languiru, apresenta traços retos, simétricos, minimalistas, característicos de um modernismo tardio. Portanto, outra vertente, outra proposta, até por conta da época em que foram erguidas. Essas igrejas integram o Sínodo Vale do Taquari, sediado em Teutônia, e que é composto por 15 paróquias e 59 comunidades.

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