“Cada cidade é uma nova aventura, um novo desafio”. Viver em movimento é uma das características de quem entra para o mundo do circo. Nascido e criado nesse ambiente nômade, Djalma Dias Farias, 57 anos, lidera o Circo Fox, que se instalou ao lado da prefeitura de Teutônia na semana passada. Representante da quinta geração circense da família, afirma desconhecer um jeito de viver que seja mais proveitoso do que esse.
Antes de vir a Teutônia, a trupe estava em Bom Retiro do Sul. Antes de virem ao Vale do Taquari, fizeram roteiros em regiões como Vale do Rio Pardo, Centro, Missões, Fronteira Oeste, Campanha e Sul, perpassando municípios como Santa Cruz do Sul, Santa Maria, São Luiz Gonzaga, Bagé, Dom Pedrito, Santana do Livramento, Quaraí, Barra do Quaraí, Uruguaiana, Itaqui, São Borja, Rio Grande e Pelotas.
Com base em Boa Esperança, no Paraná, o grupo integra a rede de oito circos da família espalhados pelo Brasil. Com 15 anos de trajetória, o Circo Fox está há seis no Rio Grande do Sul, e com frequência visita também localidades da Argentina e do Uruguai. Djalma Dias Farias, no entanto, já percorreu boa parte do território brasileiro levando a arte para São Paulo, Goiás, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Bahia, Tocantins e Amazonas.
“Temos quatro casas para morar, mas nunca dormi em nenhuma. Como viajamos sempre de motor home, estacionamos no quintal ou na garagem, e sempre durmo dentro dele”, revela. A família chega a utilizar a estrutura da casa, como cozinha, sala, banheiros, mas na hora de dormir, vai para o motorhome. “Parece que me falta ar se eu dormir dentro de casa”.
Entre as vantagens da vida itinerante, menciona o contato com culturas diversas, o aprendizado com as comunidades e a evolução que cada experiência proporciona. “Se existe uma vida mais proveitosa do que essa, eu não conheço”, comenta Farias, que já prepara a próxima rota, que começa no domingo. Garibaldi será o próximo paradeiro, para iniciar a incursão na Serra Gaúcha. “Estamos muito bem aqui hoje, mas a minha mente já está pensando para onde vamos”.
Um dia para instalar o circo, outro para desarmar. Com estruturas dobráveis e desmontáveis, a instalação ocorre de forma surpreendentemente rápida. E os movimentos logísticos costumam ser feitos à noite e de madrugada, para evitar o trânsito. “Um dia amanhece, e simplesmente não estamos mais aqui. Não fica um papel de bala no chão”. Conforme o líder, a trupe gosta de toda a função da mudança, do trajeto.
“Temos quatro casas para morar, mas nunca dormi em nenhuma. Como viajamos sempre de motor home, estacionamos no quintal ou na garagem, e sempre durmo dentro dele” – Djalma Dias Farias – Proprietário do Circo Fox
De escola em escola
Atualmente, o Circo Fox conta com 31 integrantes. Conforme Farias, não há funcionários. “Os artistas são nossos familiares, filhos, netos, genros. Hoje virou um negócio familiar”, comenta.
Entre os membros, há seis crianças. Elas frequentam escolas das localidades por onde o circo passa. Junto com o pedido de matrícula, vai o pedido de transferência. Esse formato tem amparo legal, principalmente na Resolução Nº 3 do Ministério da Educação, de 16 de maio de 2012, que define diretrizes para o atendimento de educação escolar para populações em situação de itinerância.
As escolas fazem avaliações dos estudantes e notas parciais são colocadas no histórico.
“Nós levamos a educação muito a sério. O meu pai nos ensinou assim. Eu tenho 12 certificados pelo Senai, por exemplo, talvez nunca precise. Nossas crianças são muito boas nas escolas. Sem distrações, sem muitas amizades, são muito focadas no estudo”, afirma.
Assim como ele, Farias diz que os pequenos já crescem com a mentalidade de integrar o circo. Muitas modalidades, inclusive, exigem habilidades que precisam ser desenvolvidas desde a infância. Com os estudos e o tempo para brincar garantidos, assegura Farias, faz parte da cultura circense envolver os menores nas práticas.
“Somos como os japoneses, que sempre pensam nos seus descendentes. Por isso, estamos sempre formando e orientando os pequenos a dar seguimento. Essa cultura não pode parar”, comenta.
“Nós levamos a educação muito a sério. O meu pai nos ensinou assim. Eu tenho 12 certificados pelo Senai, por exemplo, talvez nunca precise. Nossas crianças são muito boas nas escolas. Sem distrações, sem muitas amizades, são muito focadas no estudo” – Djalma Dias Farias – Proprietário do Circo Fox
O palhaço que não gostava de palhaço

Alexandre Luiz não gostava de palhaços, mas hoje é o Fuça-Fuça (Foto: Édson Luis Schaeffer)
Alexandre Luiz, 36 anos, é natural de Campinas (SP). Aos 12 anos, teve a oportunidade de assistir, pela primeira vez, uma apresentação de circo e passou a gostar de acompanhar os bastidores, ajudar a montar as estruturas e fazer amizade com os artistas. Em determinado momento, surgiu o convite para fazer parte.
Passou a admirar ainda mais a arte circense. No entanto, de uma coisa ele não era fã: os palhaços. Mas quis o destino que ele fizesse amizade justamente com um intérprete de palhaço. E não demorou muito, foi convidado a ser um dos palhaços do circo. “Primeiro tive muita vergonha. Mas logo me apaixonei pela profissão, pois foi lindo demais ver o sorriso das pessoas”, coloca.
Aos 16 anos, passou a integrar o Circo Fox e foi adotado por toda a equipe. “O Djalma é como se fosse meu pai. Tanto que ele me chama de filho, eu o chamo de pai. Aqui hoje é minha família”, destaca. Além de artista, Alexandre, assim como os demais integrantes, auxilia no dia a dia do circo, ajudando a montar as estruturas e a manter o ambiente organizado e limpo.
O nome artístico, Fuça-Fuça, foi criado pelos colegas do circo, trazendo um pouco da personalidade de Alexandre, de ser curioso. “Eu vivia fuçando por aí, sempre querendo aprender algo novo”, conta. Assim também já coube a Alexandre dar o nome do seu pequeno aprendiz, que está sendo conhecido como Bolachinha. “O circo é minha casa. Não me vejo fazendo outra coisa. E poder passar essa paixão para as futuras gerações não tem preço”, sublinha.
“O circo me permite ser quem sou”

Tiarles Diones teve sua vida transformada no circo (Foto: Édson Luis Schaeffer)
Tiarles Diones, 19 anos, encontrou no circo a oportunidade de ser quem ele é. Foi onde venceu a barreira da autoaceitação da homoafetividade e passou a ser feliz de fato. Natural de Pinheiro Machado (RS), desde criança sempre foi fascinado pela arte circense, especialmente no tecido acrobático. Em cada circo que chegava na cidade, ele pedia para se apresentar, o que foi qualificando o seu show.
Quando o Circo Fox se instalou em Pinheiro Machado no período pós-pandemia, foi amor à primeira vista. “Pedi uma oportunidade, que foi me dada no último dia de espetáculos. Foi incrível, pois meus pais e amigos foram me assistir”, comenta. Em cada cidade que o Circo Fox ia, Tiarles acompanhava. “Meu pai se tornou amigo próximo do Djalma e eu fui alimentando o sonho de que, quando completasse 18 anos, iria ser da equipe do Circo Fox. Estou há quase dois anos aqui e é algo que eu amo demais”, frisa.
Hoje, Tiarles é uma das principais atrações. Realiza apresentações de tecido acrobático, bambolê e lira espacial. “O circo é arte. Muito mais que levar alegria ao público, é também levar alegria para nós mesmos, pois amamos o que fazemos. Ver o sorriso das pessoas não tem preço”, sublinha.
E foi justamente o circo que representou uma virada de chave na vida de Tiarles. “Eu estava me descobrindo e entrei em depressão. O circo foi o que me libertou de tudo. O circo me permite ser quem sou. Quando nos aceitamos, tudo fica mais fácil, ainda mais aqui, onde somos uma grande família. O Seu Djalma é como um pai para mim e eu sou muito grato”, ressalta.
66 anos de vida e de circo
O argentino Sergio de La Torre tem 66 anos de vida e de circo. De família circense, desde os primeiros dias já estava vivendo a rotina do circo. Sua esposa é da família circense Aires. Então, naturalmente, seus filhos e netos também seguem a tradição. Uma de suas filhas é, há cerca de 10 anos, esposa do líder do Circo Fox, Djalma Dias Farias.
Por muito tempo, de La Torre era uma das atrações do Globo da Morte. Mas, hoje, somente atua na manutenção do circo, sendo um dos responsáveis pela montagem e desmontagem da estrutura e pelos reparos necessários, além de auxiliar na divulgação por meio do carro de som.
Ao longo de sua vida, viu a arte passar por muitas transformações, mas a paixão pelo circo permanece no sangue ou, como se fala no meio circense, na serragem. “Aqui temos pessoas que amam o que fazem. Faça chuva, faça sol, nossa missão é levar alegria para as pessoas. Isso nos faz muito bem. A minha vida é o circo”, afirma.

Sergio de La Torre tem 66 anos e é responsável pela manutenção (Foto: Édson Luis Schaeffer)