O Conselho Nacional de Trânsito (Contran) aprovou, na segunda-feira, 1º, a resolução que acaba com a obrigatoriedade de frequentar aulas de autoescola na preparação para os exames teórico e prático dos Departamentos de Trânsito (Detrans). A norma entrará em vigor assim que for publicada no Diário Oficial da União, o que deve ocorrer nos próximos dias. Antes da divulgação, a pro posta passou por consulta pública por cerca de um mês e teria recebido cerca de 70 mil contribuições.
Segundo o governo, o custo para obtenção da Carteira Nacional de Habilitação (CNH), que hoje pode chegar a R$ 5 mil, será reduzido em até 80%. Facilitar o acesso ao documento é o principal objetivo da medida. Dados da Secretaria Nacional de Trânsito (Senatran) apontam que 20 milhões de brasileiros já dirigem sem habilitação e mais 30 milhões têm idade para ter a CNH, mas não o possuem.
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A abertura do processo poderá ser feita diretamente pelo site do Ministério dos Transportes ou por meio da Carteira Digital de Trânsito (CDT). É necessário ter 18 anos e saber ler e escrever. Além disso, o cidadão ainda precisará comparecer pre sencialmente a etapas como coleta biométrica e exame médico. Haverá curso teórico gratuito e digital.
Embora o ministério se comprometa a disponibilizar o conteúdo online sem custos, o candidato, se preferir, poderá estudar presencial mente nas autoescolas. Também está prevista uma “flexibilidade” das aulas práticas e abertura para instrutores credenciados pelos Detrans, a fim de ampliar opções para o cidadão. O novo modelo retira a exigência de 20 horas- -aula práticas. Agora, a carga horária mínima será de duas horas, com permissão para uso de carro próprio.
O candidato poderá es colher como fará sua preparação: seja por meio de um Centro de Formação de Condutores (CFC) tradicional ou com a contratação de um instrutor autônomo. Nenhum profissional poderá atuar sem credenciamento oficial: todos passarão por fiscalização pelos órgãos estaduais, deverão cumprir requisitos padronizados nacionalmente e serão identificados digitalmente na CDT.
O texto também prevê a facilitação dos processos de obtenção da CNH para as categorias C (veículos de carga, como caminhões), D (transporte de passageiros, como ônibus) e E (carretas e veículos articulados), permitindo mais opções de formação, com o objetivo de tornar o processo mais ágil e menos burocrático. Entre os pontos que ainda carecem de esclarecimento, estão as regras específicas para o uso dos veículos próprios nas aulas práticas, como irá funcionar a plataforma digital para solicitar a CNH, bem como os procedimentos para cadastro e fiscalização dos instrutores.
Segundo a Senatran, o Rio Grande do Sul tem o custo mais alto do país para se obter a habilitação na categoria AB. Atualmente, o valor chega a R$ 4.951,35. Na contramão, o processo mais barato ocorre na Paraíba, onde os futuros condutores pagam R$ 1.950,40.
Visão dos CFCs
Para a diretora de ensi no e instrutora teórica do CFC Reichert, Lirian Lagemann, as mudanças podem comprometer diretamente a qualidade da formação de condutores em todo o país. Segundo ela, a tentativa de “baratear a CNH”, como alega o ministro, pode ter como consequência a perda de vidas. Além disso, a cate goria se considera vulnerável diante da ideia de simplifica ção do processo.
Lirian assegura que os anos de experiência lhe dão o discernimento dos riscos que as ruas e estradas podem oferecer. Desta forma, demonstram o quanto habi litar um condutor vai além do cumprimento de uma carga horária, assistir víde os ou assinar documentos. Significa preparar pessoas para compartilhar espaços com outras pessoas. “Não existe carteira de habilitação barata quando o custo pode ser a segurança humana”, finaliza.
Na avaliação do diretor do CFC Schneider, Jefer son Althaus, as medidas significam um retrocesso e não podem ser encaradas como “flexibilização”, como menciona o governo. Além disso, a resolução pode provocar a desestruturação das autoescolas, principalmente nos âmbitos da demissão em massa dos funcionários e desvalorização dos instrutores.
Desta forma, toda a sociedade tem a perder com o preparo considerado abaixo do ideal para o enfrentamento de um trânsito cada vez mais carregado. Esses dois CFCs são referência para toda a microrregião de Teutônia.
O que diz o Detran
Em nota assinada pela diretora-geral, Isabel Friski, o Detran-RS afirmou que “reconhece e exalta a democratização do acesso à primeira habilitação que fundamenta a proposta”. Por outro lado, chama a atenção para a necessidade de “um cuidadoso e fundamental período de transição para que todas as adaptações técnicas, operacionais e de
formação sejam plenamente implementadas, de forma ordenada e sem causar prejuízos ou transtornos aos cidadãos”. O órgão menciona, ainda, crer em ajustes no que foi anunciado.
Decreto “Anti-Resolução”
Paralelamente, o projeto de decreto legislativo (PDL) 1031/2025, de autoria do deputado federal, Coronel Meira (PL/PE) tramita no Câmara e visa sustar os efeitos da resolução, por conta de supostos erros jurídicos e ilegalidades, assim que for publicada. Conforme o texto, a iniciativa do Contran extrapola o poder regulamentar ao “desestruturar o sistema de formação de condutores sem considerar o equilíbrio entre acessibilidade e qualidade”.
Além disso, o impacto econômico é classificado como “devastador”. O parlamentar cita que o setor emprega mais de 200 mil pessoas e a falta da da obrigatoriedade causará queda de, ao menos, 77% no faturamento dos CFCs. Uma das consequências seria o fechamento de unidades por todo o Brasil.
