Certa vez, o poeta Mário Quintana afirmou que “o passado não reconhece seu lugar: está sempre presente”. Essa máxima é seguida à risca pelas famílias Horst, Ahlert e Dahmer, no interior de Westfália. Com acervos históricos e manutenção de uma residência sesquicentenária, elas conectam gerações, valorizam as origens e os laços afetivos. Preservam legados.
À beira da estrada de Linha Paissandu, uma casa em estilo enxaimel chama a atenção pela riqueza de detalhes, com direito a cozinha e patente erguidas separadas da construção principal. No pátio, inclusive, há um forno à lenha.
Esse complexo faz parte do Museu do Vô Liro. O espaço foi construído pelo casal Liro e Selita Horst no ápice da pandemia. Entre a obra, que preserva as características da imigração alemã, e a reunião dos itens, foram cerca de três anos.

Liro demonstra como era o funcionamento de cada item do Museu.
Segundo Selita, a ideia do Museu surgiu em razão da grande quantidade de objetos guardados na residência do casal, localizada do outro lado da rua.
Amante de antiguidades, Liro destaca que fez diversas compras ao longo da vida de pedreiro, bem como recebeu doações de amigos e clientes.
São centenas de objetos, documentos, ferramentas, fotos e até produtos que contam a história de vida do casal e de seus antepassados.
Entre os mais curiosos, quadros com as grinaldas utilizadas pela avó de Selita no seu casamento, há mais de 120 anos, chuveiro, lamparinas, uma batedeira acionada por manivela, colchão de palha, travesseiro com pena de ganso, lâmpada importada da Alemanha e até um frasco do laxante Olina, fabricado em 1916.
“Aqui está a nossa história, a nossa identidade. É a concretização de um sonho de vida”, afirma Liro, emocionado. Ele acrescenta que, a cada visita, faz questão de contar a história de cada objeto e demonstrar como era o funcionamento. Claro, com auxílio de Selita.
Essa interação os transporta para o deleite das vivências de outrora. É possível visitar o Museu do Vô Liro diariamente. Contudo, os proprietários solicitam agendamento em casos de grupos maiores.

Placa na fachada demonstra a relevância histórica da residência dos Ahlert.
O museu dos Alhlert
“Das erste Haus der Stamvater Christian Ahlert in Brasilien”. Gravada em uma placa de madeira, esta frase indica a representatividade de uma casa erguida na atual Rua Rufino Ahlert.
Na tradução literal, a placa informa que se trata da primeira casa do antepassado Christian Ahlert no Brasil”. Nascido em Hannover, Alemanha, o imigrante rumou ao país no dia 8 de junho de 1871.
Bisneto de Christian e guardião do local, Olavo Ahlert, destaca que o bisavô se estabeleceu com a esposa e oito filhos na pequena residência. Ele veio primeiro. A estrutura foi erguida com madeira de batinga, conhecida por alta durabilidade. Parte da construção é original.
Em meados de 1994, houve o transporte da moradia para a margem da estrada, a fim de facilitar o acesso dos visitantes. Antes, estava localizada abaixo do nível da rua. Nela, são guardados quadros, utensílios e outros itens da história da família.
Conforme Olavo, por meio da união entre Edwino, Arnoldo, Walter e Lucildo Ahlert, foi feito o resgate histórico e a busca de objetos para criar o museu da família. Atualmente, o espaço passa por uma reorganização.
A ideia ganhou força a partir de 1988. Também naquela década, ocorreu uma campanha para arrecadar fundos e identificar o túmulo de Christian, cujo sepultamento ocorreu no Cemitério Evangélico da Linha Schmidt. “Ao transmitirmos a importância da preservação aos mais jovens, abrimos o leque para a continuidade dessa trajetória”, reforça Olavo.
Casarão das gerações
Ao lado da Igreja da Comunidade Evangélica Sião, em Linha Frank, um casarão com mais de 150 anos recebe zelo especial do professor aposentado e escritor Elio Dahmer. Diferentemente de outras residências da região, idealizadas no estilo enxaimel, a casa é de alvenaria e com janelas em arco.
Erguida entre 1870 e 1872, a construção teve outros proprietários até chegar à posse dos Dahmer.
Nascido em 1940, Elio viveu durante muitos anos no local. Primeiro, com os pais, Ermindo e Melita Dahmer, e os avós. E depois, com a esposa Dalila Dahmer, com quem subiu ao altar em 1958. Dessa união, nasceram quatro filhos. Ela faleceu em 2017.
Mais tarde, a família construiu outra casa no mesmo terreno. Atualmente, a antiga moradia guarda alguns móveis e fotos da família. Contudo, prevalecem algumas particularidades. Uma delas, segundo Elio, é a manutenção de pinturas originais feitas por um artista alemão.
O proprietário se recorda também de quando um cavalete, semelhante aos utilizados em pinturas, foi encontrado no sótão. Mais tarde, se descobriu que a casa sediou aulas na década de 1880. Na época, a escola da localidade pegou fogo.
Outra curiosidade diz respeito à presença de Lucy Markus na residência. Na juventude, a moça se apresentava em reuniões dançantes promovidas no local. A família de Elio era amiga de Augusto Markus, ex-prefeito de Estrela, pai da jovem. Anos depois, ela se casou com Ernesto Geisel, presidente de 1974 a 1979.
Por todo o significado, a restauração da residência é um sonho de Elio. “Dos melhores aos piores momentos, as paredes desta casa testemunharam a trajetória da nossa família. Então, é justo preservá-la”, conclui.

Na casa de mais de 150 anos, Elio mantém as fotografias dos avós, pais e do seu casamento.